Candidaturas à Ordem dos Enfermeiros: Ana Rita Cavaco

Apesar de ainda estarmos a uns meses das eleições da OE (Ordem dos Enfermeiros) já se perfila pelo menos uma candidatura: A da Enfª Ana Rita Cavaco.

Há que lhe dar o mérito por ter avançado com um projecto de forma tão antecipada ou até precoce. Isto porque obriga desde já a reflectirmos sobre o estado actual da profissão, da actuação da OE e do que queremos para o futuro. Um agitar das águas conveniente e até bem-vindo face ao marasmo que se tornou todo o debate em torno daquilo que torna uma profissão , uma profissão e um projecto de vida, a evolução ao longo da mesma, a carreira. Este tema tornou-se tabu face ao clima de restrição económica mas antes de mais restrição moral.
 Fizeram-nos acreditar que querer mais era egoísta e que o país não suporta este tipo de reivindicações. Algum dia suportará? Conheço caso algum em que o benefício de um grupo seja bem acolhido por outros, principalmente quando se lhes vai ao bolso, por assim dizer…

Mas não é isso que está aqui em causa…


O programa de Ana Rita Cavaco ( que me perdoem o termo abusivo mas estamos a falar em politiquês) pode ser consultado aqui: http://www.mudaroe.com/

E que propostas apresenta?

1. Processar o Estado Português por não equiparação dos salários dos enfermeiros a outros licenciados


O que à primeira leitura parece algo de inteira justiça, contradiz-se nalguns parágrafos doutras propostas, nomeadamente na 3ª Proposta em que se alude ao papel abusivo das Ordens Profissionais na defesa dos seus membros… Então o que dizer desta proposta? Não é abusivo aproveitar os fundos dos seus membros em processar o Estado que legitima a existência da própria OE? Com certeza existirão formas mais sensatas de atingir o objectivo de justiça salarial que não passam por propostas sensacionalistas e sem qualquer pingo de verdade ou legitimidade...

2. Isenção da quotização e inscrição na OE (para desempregados por ex…).

Num país onde a regulação laboral é o que é, como garantir que alguém não enfermeiro exerce um cargo de enfermeiro ? O mesmo problema se aplica à verificação da existência dum vínculo laboral. Como verificar que alguém está a exercer a profissão? Não desconfiando da honestidade de ninguém mas julgo ser imprudente, senão mesmo irresponsável, confiar que alguém assumirá estar a trabalhar, tendo o estatuto de isento para passar ao não isento(ou seja pagar as quotas? Se nas instituições do Estado e grandes grupos privados esse é um imperativo legal claramente seguido, será que em empresas mais pequenas como clínicas ou lares tal será igualmente verdade? Parece-me que em poucos anos não existiria quem pagasse as quotas… Claro que tudo isto seria desnecessário se não existisse desemprego e se não fossemos seres humanos (imperfeitos por natureza) mas é mesmo assim que as coisas são…

3. Qualidade de Ensino, serviços de saúde de qualidade
Uma aliança estratégica entre enfermeiros e cidadãos.


Criar rankings das instituições de ensino pode parecer uma medida óptima, porém, e à semelhança de outros ranking (vide classificação da revista sábado quanto aos hospitais) encerram muitas injustiças se não forem seleccionados os critérios adequados. Desafio-a a dizer-me quais os critérios que usaria para classificar as instituições. Se me falasse em certificar planos de estudos e eventualmente em elaborar um plano de estudos tipo, talvez ainda pensasse nisso, agora não estou mesmo a ver critérios objectivamente mensuráveis e igualmente não redutores possam usar para classificar as instituições de ensino.
Uma coisa é dizer aprovo ou não aprovo tal instituição, outra é conseguir dizer com precisão que uma é melhor que outra em 2% ou com mais 0.4 valores (de 0 a 20).
Sem dúvida uma ideia curiosa mas não mais do que isso.

Quanto às outras sub-propostas , genericamente parecem razoáveis, à excepção do provedor do enfermeiro em que basicamente se assume como um sindicato porém quando passamos à exposição de motivos percebemos que esta intenção se torna clara e entra claramente em total incoerência com aquilo que mais à frente enuncia como a razão pela qual o papel das Ordens profissionais está a ser equacionado em sede de organismos centrais europeus… A ingerência das Ordens em assuntos que não lhes competem…

Não percebo… Temem a adopção de mecanismos de regulação da profissão, que apenas visam qualificar melhor os enfermeiros vindouros, e por conseguinte a qualidade dos cuidados à população, nomeadamente quando falam de campos de estágio sobrelotados, e depois arengam com injustiça moral o querer implementar um modelo de melhor qualificação profissional dos enfermeiros (o MDP)?

Reparem que quando o modelo estava a ser discutido este foi severamente criticado pelas instituições de ensino, as mesmas que agora critica mas ao mesmo tempo defende o mesmo ponto de vista destas… Incoerências? Vá-se lá saber…

Depois fala na questão de campos de estágio como lares ou creches: Se falarmos na orientação de alunos por não enfermeiros nada a opor até porque tal situação até é contra o REPE e código deontológico sendo até uma vergonha tal ainda poder ser verdade, mas o facto é que face àquilo que é a Enfermagem do futuro, tais contextos de actuação são do âmbito do enfermeiro, por exemplo do enfermeiro especialista em saúde infantil ou da pessoa em situação crónica /paliativa ou saúde do idoso.
Ou só se é enfermeiro no hospital ou centro de saúde? Uma visão retrógrada da profissão a meu ver e que hipoteca o futuro de actuação, assim como toda a base da disciplina da enfermagem, uma negação do metaparadigma da enfermagem… Ou seja uma falta de sustentação científica baseada em argumentos de índole populista e assimilação fácil.

4. Enfermeiros Militares.

Guardar toda uma proposta para os enfermeiros militares apenas eterniza o problema. Estes são ou não são enfermeiros como os outros? Com os mesmos problemas (também os outros enfermeiros não recebem nem são reconhecidos como licenciados) no seu posicionamento na organização em que exercem . Com a mesma dificuldade imoral em necessitar de provar a dobrar o que merecem?

Ou seja, os problemas deles são comuns a todos e até é uma falta de respeito por estes diferenciá-los dos outros ao remeter propostas unicamente para estes, até parece que a formação destes é diferente da dos restantes. São todos enfermeiros com a excepção de que estes são militares assim como os outros são civis. Mas são todos enfermeiros à mesma.
Resolvendo o problema de uns resolve-se o problema de todos… A não ser que devamos criar uma Associação diferente para os Militares (sarcasmo). Só nos vendo como iguais podemos ser tratados como iguais!

Isto para dizer: Independentemente de assumir algumas posições claramente importantes em prol do reconhecimento da profissão urge fazê-lo duma forma responsável, coerente e acima de tudo com credibilidade e não baseado numa mão de lugares comuns e chavões repetidos por quem teria a obrigação de ter mais conhecimento sobre aquilo que defende.


Pelos menos servirá para agitar as águas e promover o debate, sempre bem-vindo, e fazer-nos pensar no que realmente pretendemos? Sermos vistos como credíveis ou como populistas?

14 thoughts on “Candidaturas à Ordem dos Enfermeiros: Ana Rita Cavaco

  1. Será que a Enfª Ana Rita vai manter a sua 1ª proposta de processar judicialmente o Estado Português agora que este é do PSD? Será que a Enfª Ana Rita já sabe que a 2ª proposta já é uma realidade e portanto é o mesmo que prometer algo que já existe, tipo prometer construir o estádio da Luz?

  2. Como se pode ser zeloso e revolucionário ao mesmo tempo? Porque não?As pessoas inconformadas e que não se resignam (revolucionárias dizes tu) não podem ser zelosas?Explica lá quem está contra as directivas da UE, não disse nada disso, expliquei apenas o que se discute no Parlamento Europeu.Já te respondi à questão do Estado,Ministério da Saúde.O problema Mauro Germano:-) é que não apoias a nossa candidatura, isso não é mau, é saudável. Não te dá é o distanciamento necessário para esta discussão de ideias.Também notei, pela questão da zelosa e revolucionária, que tens um pensamento métrico e isso reflecte-se na forma como vês as nossas ideias e a minha postura em particular.Mauro, entre o branco e o preto existem muitas cores.Como o zeloso e o inconformado, o que não se resigna, o que ousa pensar diferente, podem existir em simultâneo como num quadro com muitas cores.BeijinhosAna Rita Cavaco

  3. http://dl.dropbox.com/u/13255086/Projecto%20Regime%20PTE%20V3.pdfPartilho convosco o diploma de EPT (internato) que está em Conselho de Ministros para aprovação (clicar na ligação para ver o diploma).Achamos que todos os Enfermeiros merecem saber o que se está a passar e o que implica. Foi precisamente por temer isto que nos assumimos contra o internato e foi isto que escrevemos ao Presidente da República.‎1- Não estão garantidas vagas para todos no internato (Há a possibilidade de terem de esperar mais de 2/3 anos para terem acesso), o diploma é muito claro, não garante acesso a todos;2- É feito por concurso, logo obrigado a prazos e todos os procedimentos legais inerentes, na melhor das hipóteses quem termina a licenciatura em Julho só inicia o internato em Maio com tudo a correr pelo melhor (por exemplo, se houver impugnação do concurso nem em Maio);3- Os internos no fundo não são internos, têm de fazer um contrato de trabalho com as Instituições de Saúde para onde vão e os valores não estão definidos no diploma;4- A Ministra da Saúde (na nota justificativa do diploma, procurem no final do articulado) chama os internos de trabalhadores e realça o facto de, com a entrada deles, se reduzirem significativamente as necessidades de contratação de Enfermeiros para o SNS (está mesmo escrito).5- Alude ainda ao facto de não prejudicar a produtividade dos supervisores clínicos nos serviços onde estão porque os internos vão substituí-los na função de prestação de cuidados que desempenham (também está escrito);6- Como não vão existir vagas para todos (também está escrito que as vagas são definidas de acordo com as necessidades dos serviços) o mais certo é que depois de um curso superior de 4 anos, com a expectativa de começar a exercer, alguém poderá apresentar uma queixa no Tribunal Constitucional por restrição do acesso à profissão.O “internato” são contratos de um ano, a 500 euros líquidos por mês. O internato é um exército de enfermeiros a preço de saldo, substituído por outro contingente ao fim de 12 meses. O “internato” é também um castigo discriminatório. Um enfermeiro português não poderá aceitar um convite do estrangeiro sem o “internato”, mas ele não será exigido a nenhum enfermeiro europeu que venha trabalhar em Portugal.Desfeita a mistificação, não tenhamos medo de discutir a “segurança”. O erro é sempre uma possibilidade, uma ameaça à prestação de cuidados de saúde. Claro que tem de ser combatido. Há serviços com políticas activas para diminuir o risco. Mas o Estado também devia assumir esse combate. Os serviços têm de oferecer aos doentes o número de enfermeiros indispensável ao volume e à complexidade do trabalho. Neste aspecto, temos vindo sempre a piorar.Durante oito anos, perante o grave problema das vagas por preencher nos serviços de saúde, a OE calou-se sempre. O “internato” será apenas mais um paliativo, para que o Governo adie a contratação de enfermeiros e para a OE prosseguir o seu simpático papel de avestruz.Mais informações em http://www.facebook.com/group.php?gid=317526618304#!/group.php?gid=317526618304, página de candidatura.Beijinhos a todosAna Rita Cavaco

  4. Por um lado é incorrecto estar contra as directivas da UE, por outro não há problema em estar contra o Estado… Não percebo como pode ser tão zelosa por um lado e por outro tão revolucionária.Ah… e Juridicamente é diferente processar um instituto público (Infarmed) e o próprio Estado em si, embora não saiba a que parte do Estado se dirige.Gostava que esta medida fosse mais do que um apelo ao populismo…

  5. Olá a todos.Só quero transmitir que a meu ver a postura de dar a cara e ser frontal nas ideias que são defendidas, independentemente se estão corretas ou incorrectas, é uma atitude muito positiva. Esperemos que todos os candidatos apresentem esta filosofia.Cumprimentos,Vítor

  6. Quem é a Enfª Ana Rita ? Sou Enfermeiro há quase 30 anos e depáro-me com uma estranha que se candidata a Bastonária!! A Enfª Ana Rita evoluiu à custa de que politico??Eu teria vergonha de me candidatar depois de ter aproveitado a "Boleia" do Ex-Sec de Estado Carlos Martins!!Não é a Enfª que chegou a Supervisora do INEM ???Se não é peço desculpa.Esse tipo de subida na profissão em nada nos dignifica.A Enfermagem merece muito mais. Esse tipo de coisas faz-me pensar em tempos recuados, que não queremos mais.Eu quero um Bastonário com peso e credibilidade pelo que faz e pelo que fez… Teremos que encontrar alguém que não a desconhecida Ana Rita…

  7. Claro que sim. Eu defendo que não devemos nunca ir para casa com nada por dizer.Pode ser que nos encontremos amanhã:-) Obrigada eu pela oportunidade de debate saudável.Um beijinhoAna Rita

  8. A seu tempo discutiremos melhor estas propostas e a sua exequibilidade.As opiniões são muitas e neste caso são distintas. Nada de assustador dado estarmos em democracia e num saudável espírito crítioAgradeço-lhe de antemão o respeito por ter respondido.Espero que nos encontremos "por aí" um dia desses.Abraço

  9. É exactamente a mesma coisa. Faz-me lembrar a questão das mentiras, há as piedosas e as maldosas mas são as duas mentira não são?A 3ª proposta é coerente sim porque o problema do extravasamento de competências das Ordens nesta questão é apenas relativamente à limitação do acesso e às desigualdades geradas. É só uma questão fulcrar de liberdade, coisa pouca de direitos, liberdades e garantias…Apenas isto.Um beijinhoAna Rita

  10. Digamos que é um pouco diferente de "processar" uma empresa pública ou instituto público e processar o Estado em si, não acha?Mas não é essa a questão pois não?Se não queremos colar uma imagem de extrasamento de poder das ordens profissionais, nomeadamente a nossa. Sendo neste papel ou noutro, como referiu na 3 proposta, esta medida não é lá muito coerente ora não?

  11. MauroApenas uma questão. A Ordem dos Enfermeiros tem um processo contra o INFARMED, a afronta é a mesma ou é diferente de processar o Ministério da Saúde? Ou só se pode para Institutos Públicos?Um beijinhoAna Rita

  12. Antes de mais obrigado por responder ao meu post. Agradeço a atenção embora, tal como a Ana Rita não concorda comigo eu também não concordo consigo, mas ainda bem que estamos num país democrático e ainda podemos discutir sem irmos presos ou nos agredirmos.LolNão acho que seja preconceituoso , limitei-me a analisar as propostas e obviamente, derivado do facto de ter uma visão diferente da sua nessas matérias, discordei. Tal não deve ser entendido por preconceito.Não coloquei em questão a veracidade da informação relativamente aos lares(peço desculpa se induzi em erro) mas sim o facto de ter mencionado esses meios, aparentemente como impróprios para ensinos clínicos. Eu sei que não foi isso que disse, mas ao associar esses locais (como muitos outros) a processos de supervisão inadequados, implicitamente induziu a pensar que estes seriam desadequados. Não sou omnipresente mas também não ando cá há 2 dias e apesar de não presenciar essas situações , pelo "diz que disse" acredito que existam.Quanto às directivas comunitárias, há muitas outras, no caso da enfermagem por exemplo, que não são aplicadas. Falou em ingerência das Ordens, mas quer que a nossa seja igualmente ingerente noutros assuntos.Como pode defender uma acção judicial, através do poder da Ordem, contra o Estado. Quer maior afronta?Em relação às quotas acredito que seja uma boa intenção mas inexequível.Quanto ao internato, tal não é uma preocupação limitada aos enfermeiros portugueses. Se quiser aconselho-a a ler um post aqui no saúde em portugal intitulado Revisão do ensino de enfermagem.Negar isto é manter o estado actual de desadequação da realidade do ensino com a prática profissional. É que o MDP não é só o internato…Mais uma vez lhe digo. Não é preconceito. Apenas ideologias diferentes.AbraçoMauro Rosa

  13. Quem lê, e de acordo com a disposição com que lê, interpreta à sua maneira o que vê e relativamente a isso não tenho nada a dizer.Acho que tens, desde um início um preconceito e ideia pré-concebida sobre a candidatura e as propostas mas é salutar que te obrigue a pensar porque esse é também o grande problema do País, o sermos amorfos e sem ideias sobre nada.Acho grave que coloques em causa a veracidade dos estágios em lares, centros de saúde mental e creches onde os futuros Enfermeiros são orientados por não Enfermeiros. Aliás não é grave, é muito grave porque falamos de curso de base, e é o que diz a proposta, e porque demonstra que desconheces o que se passa na realidade e falas sobre isso induzindo em erro quem te lê. Quem pretende difundir a sua opinião também tem responsabilidades acrescídas, é a minha opinião, e por isso não pode esconder ou desconhecer um facto tão grave como este.Gostava que fosses investigar a questão das directivas comunitárias, de uma forma séria sem atirar para o ar suposições, e também essa questão do Estado independente para perceberes que há muito deixámos de o ser face à UE.Quando se fala do papel abusivo das Ordens é tão somente relativamente ao acesso, à inscrição para ser mais clara que não pode ser limitada.Depois acho piada que nunca ninguém quer confrontos, a OE nunca quis aborrecer-se com as Escolas e por isso cria o internato, quer estar bem com Deus e o Diabo e pelos vistos o status quo também está instalado na sociedade.Prefiro que me critiquem por fazer do que por não fazer, por propor, por ousar pensar diferente. Não tenho um pensamento alinhado, nunca tive, não é agora que vou ter.Em relação às quotas já te respondi mas não há nada a fazer o preconceito impede-te de ver outro caminho e estás no teu direito.Convido-te a sair do papel porque essa é a posição mais confortável, serás sempre muito bem vindo.Em relação ao que queres saber das propostas elas são isso mesmo, propostas, se ganhar toda a sua implementação estará no plano de actividades. É por isso que existe o voto que nos confere, ou não, a confiança para fazer diferente.Quando lemos e discutimos sem preconceito vislumbramos sempre novos caminhos e não ficamos agarrados ao mesmo, o arco íris tem muitas cores, não tem só o preto e branco.Um beijinhoAna Rita

Deixe uma resposta para Vítor Oliveira Cancelar resposta